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Hospital de L'Aquila não tinha licença de habitação Imprimir E-mail

in Público, 15.04.2009, Sofia Lorena

No dia do sismo que devastou L'Aquila e matou pelo menos 294 pessoas no Centro de Itália, mais de mil feridos dirigiram-se para o hospital da cidade, San Salvatore. Poucas horas depois, o edifício era evacuado. Ontem soube-se que não podia sequer estar aberto porque não tinha licença de habitação, o documento que certifica que uma construção cumpre os critérios de segurança, higiene e salubridade.

Para o procurador Alfredo Rossini, o inquérito sobre o terramoto que devastou a região de Abruzzo será "a mãe de todas as investigações", com 20 mil edifícios para verificar. Segundo o diário La Repubblica, o Hospital San Salvatore é já uma das prioridades deste inquérito, que visa apurar eventuais responsabilidades criminais e que o próprio Presidente, Giorgio Napolitano, tinha pedido.

De acordo com o diário italiano, as informações sobre o hospital fazem parte de um relatório enviado ao Governo Regional de Abruzzo e ao Ministério da Saúde italiano. O projecto do San Salvatore data de 1967, mas o hospital só foi inaugurado em 2000. "A parte derrubada pelo terramoto foi a primeira a ser inaugurada", escreve o La Repubblica.

As informações sobre suspeitas de más construções e avisos ignorados têm sido uma constante desde o sismo de dia 6. "Grau de segurança: próximo de zero", escrevia-se relativamente ao palácio onde funcionava a Câmara Municipal de L'Aquila numa avaliação aos "edifícios sensíveis" terminada há um ano, escreve o Corriere della Sera. As consequências do sismo para o conjunto dos edifícios também começam a ser conhecidas de forma sistematizada: o abalo (a que se seguiram dez mil réplicas) deixou inabitável uma casa em cada três na região afectada.

Na cidade de L'Aquila, capital de Abruzzo, onde o abalo chegou aos 6,3 pontos na escala de Richter e viviam 50 mil pessoas, uma casa em cada duas ficou inabitável. E entre as casas consideradas habitáveis, em 20 por cento delas terão de se realizar obras, segundo os peritos enviados para a região e citados pelo jornal La Stampa. Os primeiros dados sobre as lojas e as empresas indicam que 30 mil pessoas vão perder o emprego só por causa dos estragos nos edifícios.

Os habitantes das casas que os especialistas consideram em condições esperam ainda por um certificado para deixarem as tendas onde agora cai chuva e neve. Os restantes terão de esperar pela reconstrução. O ministro da Defesa, Ignazio La Russa, propõe que se destine a Abruzzo o próximo prémio máximo do sorteio do Supernalotto. "Podia ser como se Abruzzo tivesse ganho, como se tivesse saído um 6 aos afectados pelo terramoto", disse La Russa ao Il Giornale.

O apelo de Saviano
Para o jornalista Roberto Saviano, autor do livro Gomorra (adaptado ao cinema com o mesmo título), o mais importante é criar uma comissão para impedir que a máfia tome conta da reconstrução de Abruzzo. Esse risco existe, sublinha num artigo publicado no La Repubblica. "Aqui, os riscos de infiltrações criminosas são muitos. Desde há anos que os clãs da [máfia napolitana] camorra constroem e investem. E por um estranho paradoxo, até o edifício onde estava encerrada a maior parte dos chefes investidores do sector do cimento, a prisão de L'Aquila, foi o que ficou mais intacto. O mais resistente."

"As famílias da camorra e da ndrangheta [máfia da região da Calábria] sempre estiveram aqui. E não só por nas prisões de Abruzzo estar a elite dos chefes da camorra empresarial", escreve o napolitano, que vive sob ameaça de morte da camorra. Saviano aparece pouco em público, mas deixou-se fotografar em visita à zona afectada pelo sismo. "Não permitiremos especulações, escreve-o. Diz alto que não devem sequer pensar em repor o cimento. Aqui decidimos nós como reconstruir a nossa terra", pediu ao escritor um habitante de L'Aquila.

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